No meio das tragédias que assolam o mundo, que comovem até mesmo os mais calejados repórteres de guerra, levámos um choque nacional: a tragédia da Madeira. Mas em Portugal, temos outros dramas. Não são horrores como os de lá, mas não deixa de ser um drama moral. As tomadas de posição pela Fenprof e os relatórios sobre Educação, que nos colocam num ranking de desenvolvimento educacional paupérrimo. Estamos atrás dos países mais pobres da Europa. Parece que em alfabetizar somos até bons, mas depois a coisa enrola-se e fica por um patamar cada vez mais perigoso para o futuro do País.
No clima de ufanismo que anda a reinar por aí, talvez seja bom acalmarem-se e parar para reflectir. Pois, se a nossa economia já ficou completamente arruinada, a verdade é que muitas das nossas crianças continuam a brincar na lama dos bairros periféricos, as nossas famílias são soterradas em casas cuja segurança ninguém controla, os nossos jovens são assaltados e violentados nas esquinas de ruas mal iluminadas, e em condomínios de luxo somos reféns da bandidagem geral. Os velhos morrem nos corredores dos hospitais públicos, enquanto os nossos políticos continuam de braço caído de caneta ao canto da boca no remanso de relatórios, audições parlamentares e perícias para ver quem é o mais impune dos corruptos. Depois, vem a linguagem e a postura de candidatos para as campanhas eleitorais que se prevêem pouco ou nada esclarecedoras e dialogantes, e agora até está provado o que a gente já imaginava: somos péssimos em Educação.
Pergunta básica: quanto do nosso orçamento nacional (OGE) vai para educação e cultura? Quanto interesse temos num povo educado, isto é, consciente e bem informado - não só dos seus deveres e direitos cívicos, mas dos deveres dos homens públicos e do que poderia facilmente ser muito melhor neste país, que não é só dos três F's (Fátima, Fado e Futebol), mas de esforço, luta, amargura, sofrimento e desilusão?
Precisamos muito de crianças que saibam ler e escrever no fim do 1º. ciclo elementar; jovens que consigam raciocinar e tenham o hábito de ler pelo menos um jornal no 2º grau; universitários que possam expressar-se falando e escrevendo correcto, em lugar de, às vezes com o beneplácito dos professores, copiarem os trabalhos da internet.
Sou de uma família de modestos recursos. Para completar a minha preparação académica trabalhei e dei explicações a jovens estudantes em areas tão distintas como o Portugês, História ou Matemática. Exerci o duro ofício durante dez anos, nos quais me apaixonei por lidar com alunos, mas já questionava o nível de exigência que lhes podia fazer. Isso já faz algumas décadas passadas: quando éramos ingénuos, vivendo em ditadura e não antecipávamos ter em democracia o nosso país entre os piores na Educação. Quando os alunos ainda não usavam telemóvel nem iPhone nas salas de aula, quando não conversavam e gargalhavam como se estivessem no bar, nem copiavam os seus trabalhos da internet - o que hoje começa a ser considerado normal. Em suma, quando a escola e a universidade eram lugares de compostura, trabalho e aprendizagem. O relaxamento actual não é geral, mas preocupa quem deseja o melhor para esta terra.
Há gente por aí que acha que está tudo óptimo, como está: todos os que reclamam é que estão fora de moda ou da realidade moderna. Preparar com realismo e exigência para as lides da vida real seria incutir nos jovens uma resignação de negativismo para o futuro. Ou melhor, devemos deixar a juventude "aproveitar a vida": alguém me pode explicar para que serviria isso?