Liberdade e o Direito de Expressão

Neste blog praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão, próprios de Sociedades Avançadas !

domingo, 29 de novembro de 2009






A admirável Conquista do Universo



Ver e ler em: http://www.nasa.gov/multimedia/imagegallery/

Crónica de Domingo


Respeitinho é muito bonito

"Sendo humanos, homens, mulheres e crianças, somos ainda animais predadores, querendo muitas das vezes ocupar espaço às patadas. Precisamos de ser domesticados desde o dia em que se nasce, e quase até ao fim."

Nos tempos que correm, é quase um bem raro. "Respeito é muito bonito", sempre o ouvi dizer (e eu gosto), diz uma das mil frases feitas - esse subtil veneno ou pontapé no estômago - que pontilha a nossa sabedoria dita popular. Vale para muitos aspectos da nossa vida. Tanto na Europa, como aqui no Brasil, é um tema recorrente, embora por estas terras tenha outras cambiantes mais suaves que não em Portugal. Vamos ver alguns.
Escuto ainda frequentemente a queixa de mulheres de que ainda não são respeitadas como merecem, no seu trabalho ou individualmente. Primeiro, é uma questão de tempo, pois em quase todos os territórios da actividade humana, menos cozinhar e parir, elas, mulheres são novidade. Algumas ainda estão na busca do seu modo de trabalhar, de comandar, de usar a sua conquistada autonomia.
Li recentemente - querendo elogiar, um crítico escreveu isto sobre uma conhecida escritora portuguesa: "(...) é uma excelente escritora, pois, embora sendo mulher, escreve com mão de homem". Isto por si basta para reconhecer a carga do preconceito ainda existente, e que sobrevive mesmo entre pessoas com uma certa preparação, inclusive nalgumas mulheres, diga-se de passagem, que em geral são os piores juízes de outras mulheres. Se ela faz bem um trabalho (vale para juízas, reitoras, governadoras civis, vereadoras, motoristas de táxis, polícias, grandes cirurgiãs etc.), é porque o fazem como homens. Quantas gerações terão de passar, para que isso mude?
Esse preconceito é demorado e obstinado, e elas, as mulheres colaboram com ele dando uma melancólica parcela passiva. Por exemplo, no jeito como se comportam, como se vestem, como agem no trivial, ou no público, ou quando estão no poder, qualquer tipo de poder. Não é por nada que boa parte das propagandas e anúncios de quaisquer tipo de produtos usam e abusam de mulheres quase nuas ou em trejeitos sensuais: vende, dá audiência, dá vontade de comprar... o que é um modo de poder. Penso com certa frequência - por exemplo, naquela psicóloga que em tempos conheci, que atende os seus pacientes de minissaia ou profundos decotes, e digo que, lidando com a alma desses pacientes, a roupa não parece muito adequada. Nada tenho contra essas peças de roupa, desde que num corpo adolescente. Antes pelo contrário. Porque adolescentes ainda não atendem pessoas com problemas psicológicos.
Enquanto algumas mulheres se portarem "armadas" em "sex-simbol", ou crianças pouco inteligentes, ou enquanto o seu maior trunfo forem as nádegas firmes, será difícil reclamarem de que não as respeitam o suficiente, ou como devem. Estarei a dar muito valor a exterioridades como saias, joias, trejeitos? Estou. Isso é mais importante do que em princípio parece. Trabalhei com muitas mulheres de poderes vários, e sei que a aparência é o seu primeiro cartão de visita, de uma influência enorme, muitas das vezes errado e de mau gosto. Elas poderão pensar: "eu acho-me linda, eu sou sensual", estou consciente disso, mas não necessitam de o mostrar na hora errada. O segundo cartão é a linguagem: se eu não souber nem articular certo o meu pensamento falando ou escrevendo, não vou ser um grande candidato a um emprego razoável, pelo menos num cargo em que eu precise pensar... e falar. Com elas, passa-se exactamente o mesmo.
Há pais que também se queixam de que os seus filhos não os respeitam como gostariam. Um bom começo de diálogo é indagar como eles, os pais, se portam em casa perante os filhos, ou mesmo na sua ausência - que geralmente deixa vestígios. Gentis um com o outro, com empregadas, com os filhos - ou a gente acha que dentro da porta de casa, com filhos, vale tudo, até um palavrão, uma desilegante grosseria e falta de compostura? O comportamento das crianças e adolescentes e os seus conceitos sobre o mundo (eles têm-nos desde cedo, não se iludam!) reflectem a casa que habitam. Vou ser um pouco incómodo: querendo ou não, nós, somos os seus primeiros modelos, e eles percebem muito bem o que é natural e o que é fingido em nós.
Isso estende-se à escola, onde os professores suportam a violência verbal e física, agressividade, má-educação, hostilidade por parte de alguns alunos - não todos, felizmente, possivelmente nem a maioria. Se pudéssemos pesquisar a vida familiar dessa criançada, com frequência iríamos constactar que ela apenas reproduz ou continua, na rua, no pátio da escola e na sala de aula, o tratamento que predomina nas suas casas. Lá, talvez, os filhos não conheçam os limites ou, quem sabe, o pai é do tipo que aprecia um alheamento ou autoritarismo ultrapassado.
Observo muito boa gente, e não só jovens, dando aos ombros ou rindo ao assistir a uma entrevista de alguns dos nossos líderes políticos (ou escutando belas frases feitas sobre ética): também na vida pública, o respeito tem de ser conquistado e merecido. Sendo humanos, homens, mulheres e crianças, somos ainda quais animais predadores, querendo ocupar o nosso espaço às patadas. A realidade é esta, meus amigos: se pudermos, em vez de falar, rosnamos; em lugar de emendar, viramos a cara para o lado; em vez de dar a mão, cuspirmos em cima. Nós precisamos de ser domesticados desde o dia em que se nasce, e alguns mesmo, até ao fim da vida.

Carlos Ferreira


sábado, 28 de novembro de 2009


Portugueses investem em Espanha


Combustível mais barato leva os automobilistas portugueses a investirem no país vizinho


O número de automobilistas portugueses da zona da raia que se abastecem de combustível em Espanha, nomeadamente em Ayamonte, vai levar um empresário e um autarca da zona do Sabugal a investir num posto de abastecimento «no lado de lá» da fronteira.

Segundo José Manuel Campos, presidente da Junta de Freguesia de Fóios (Sabugal) e um dos sócios da empresa que vai investir no país vizinho, o equipamento está projectado para a localidade espanhola de Navasfrias, a cerca de quatro quilómetros da fronteira portuguesa.

O investimento, que englobará custos entre os 100 e os 150 mil euros, já teve início com a aquisição de um terreno e com a constituição da firma com a designação «Gasoraya», adiantou.

José Manuel Campos referiu que o processo relativo à construção do posto de combustíveis já deu entrada no Ayuntamiento de Navasfrias, aguardando pela sua aprovação.

O autarca, que faz parte da firma comercial em parceria com um empresário do Sabugal que possui umas bombas de gasolina na zona de Lisboa, admitiu que as obras no terreno possam começar em breve.

Preços mais baixos em Espanha

José Manuel Campos justifica o investimento que vai ser realizado no outro lado da fronteira, com a necessidade de colmatar uma falha que existe naquela zona raiana e atendendo aos preços dos combustíveis praticados em Espanha, que são mais baixos do que em Portugal.

O Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) praticado em Espanha atinge uma diferença percentual de cinco por cento em relação a Portugal [21 por cento em Portugal e 16 por cento em Espanha], situação que leva os residentes na zona da fronteira a optarem por abastecer as suas viaturas «no lado de lá».

«Havia umas bombas de gasolina no cruzamento da Lageosa da Raia com Aldeia Velha que encerraram e na zona raiana não temos onde nos possamos abastecer», apontou.

Por outro lado, salientou à Lusa que a construção das bombas de combustível em Navasfrias tem por objectivo «abranger as localidades espanholas e portuguesas».

«[A gasolineira] está mais virada para servir os portugueses, mas os espanhóis, tendo-a à porta de casa, não vão a outro lado», acrescentou.

O autarca de Fóios indicou também que a melhoria da estrada que faz a ligação entre Navasfrias (Espanha) e Aldeia do Bispo (Portugal), permitirá uma afluência maior de portugueses ao local.

Os investidores acreditam no sucesso do investimento, apontando que só nas localidades de Navasfrias, Valverde del Fresno (ambas em Espanha) e Fóios (Portugal), residem mais de quatro mil pessoas.



Impostos agravam crise no Turismo

IVA faz perder milhões para Espanha



Com um IVA de 20% em Portugal e de 12% no país vizinho, os preços são mais atractivos do outro lado da fronteira.

O presidente da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), João Passos, nem quer ouvir falar num possível agravamento da carga fiscal em 2011. "Não me falem em agravamento de impostos, seria uma desgraça. Não acredito que haja aumento, para já. Para nós não pode haver mais. Já estamos taxados de tal maneira, embora não propriamente de impostos, que tal iria aumentar o fosso para a concorrência", alertou.

Já Eduardo Pinto Lopes, administrador da agência de viagens Terra Brasil, garantiu ao DN que a diferença de IVA entre Portugal (20%) e Espanha (12%) pago pelas empresas do sector nas transacções provocou, em 2009, o desvio de "milhões de euros" em turistas, que optaram pelo país vizinho. "Temos muito tráfego a fugir-nos por relações de fronteira. Isso deve-se fundamentalmente a factores de competitividade, em que o IVA tem uma dinâmica muito importante. Estamos a falar de uma diferença de 8% no IVA, que nesta actividade é muitas vezes a margem bruta do negócio."

Segundo Eduardo Pinto Lopes, "há muita fuga para Espanha e muito negócio que deveria ser feito aqui que está a fugir para aquele país", lamentou.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Há falta de policiamento no Algarve

Algarve precisa do dobro dos polícias para travar crimes

O alerta é da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, considerando ser necessário cerca de três mil efectivos da PSP e GNR. Há centenas de assaltos que não são comunicados às autoridades, denunciam outros dirigentes. Temem perder turistas devido à criminalidade.


O Algarve "precisa, pelo menos, de um total de cerca de três mil agentes da GNR e da PSP ao longo de todo o ano, ou seja cerca do dobro dos efectivos, de forma a garantir policiamento de proximidade e a necessária segurança dos cidadãos". Quem o diz, em declarações ao Diário de Notícias, é o presidente da direcção da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Elidérico Viegas.

Numa altura em que o tema da segurança está a ser desvalorizado por outros responsáveis ligados ao sector do turismo, para os quais a recente vaga de assaltos violentos a cidadãos estrangeiros e a morte de um turista de nacionalidade irlandesa, não passam de "casos pontuais", Elidérico Viegas mostra-se agora mais prudente, considerando que "esta não é a altura de falar" sobre o assunto.

Já outros empresários ligados à actividade turística questionam sobre "o que farão as autoridades quando os britânicos residentes no Algarve começarem a enfrentar os assaltantes das suas residências com as armas que entretanto adquiriram para se defenderem". "Será que alguém irá preso se matar um ladrão?", interroga-se um agente turístico. "Só não tem havido mais assaltos a hotéis, porque entretanto vários estão encerrados nesta época do ano devido a obras e à quebra da procura turística", acrescenta um gestor hoteleiro.

O concelho de Albufeira é um dos mais afectados com a vaga de assaltos violentos que tem assolado o Algarve. "Não há sossego e qualquer dia é um risco para uma pessoa andar sozinha de noite na rua. A situação é mais grave em comparação com 2008. Existem gangues que espalham um sentimento de insegurança neste concelho, nomeadamente em unidades hoteleiras e estabelecimentos comerciais, com assaltos a clientes a qualquer hora, após estudarem o perfil das pessoas que pretendem roubar.

Por outro lado, diz, "há centenas de assaltos por ano neste concelho que nem são comunicados ás autoridades, pois as vítimas consideram ser uma perda de tempo sem resultados e por isso não se querem incomodar". O Algarve corre o risco de perder para outros destinos turísticos a sua mais-valia competitiva que é a segurança.


Ler notícia completa em: http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1419543&seccao=Sul

Vermelho para "Algarve Litoral"

Tribunal de Contas recusa visto prévio


O Tribunal de Contas (TC) recusou a atribuição de visto prévio ao contrato da concessão rodoviária Algarve Litoral, adjudicada ao consórcio liderado pela Edifer, disse hoje à Lusa fonte oficial da empresa.


A fonte oficial da Edifer disse à Lusa que foi informada da recusa do visto prévio pela Estradas de Portugal (EP).

A concessão Algarve Litoral é a quarta concessão rodoviária à qual o TC recusa a atribuição de visto prévio, depois das concessões Douro Interior, adjudicada ao consórcio liderado pela Mota-Engil, Auto-Estrada Transmontana, adjudicada ao consórcio encabeçado pela Soares da Costa, e Baixo Alentejo, adjudicada ao consórcio liderado pela Edifer.

A concessão Algarve Litoral encontra-se na "fase de finalização dos projectos e de arranque dos trabalhos no terreno", disse a fonte oficial da Edifer, referindo que "não são ainda relevantes nem as intervenções efectuadas nem os valores de investimento associados".

O arranque dos trabalhos nesta concessão, que representa um investimento de 399 milhões de euros e deverá criar 1.500 postos de trabalho, deverá acontecer "até ao final do ano", de acordo com a Edifer.

A concessão Algarve Litoral foi lançada em Março de 2008 e contratada em Abril de 2009 ao consórcio Rotas do Algarve Litoral, constituído pela Edifer, Iridium, Dragados, Tecnovia e Conduril.

Esta concessão inclui a construção, conservação e exploração de um conjunto de variantes das estradas nacionais (EN) 125, da EN2, EN395 e EN270.

O TC deverá ainda analisar os contratos das concessões rodoviárias Litoral Oeste e Baixo Tejo.

Criminalidade

Gangue franco-argelino assalta 30 hotéis de luxo


Grupo organizado com três indivíduos franco-argelinos foi detido pela GNR, numa megaoperação, por furtos em hotéis e vivendas de luxo. Suspeitos faziam-se passar por turistas e atacavam sempre à tarde.


Uma operação levada a efeito, na segunda-feira, cerca das 02.00, num apartamento situado na zona de Montechoro, em Albufeira, permitiu à GNR deter um grupo organizado de três indivíduos franco-argelinos por suspeita de furtos qualificados a mais de trinta unidades hoteleiras de quatro e cinco estrelas e vivendas de luxo no Algarve.

Segundo noticiou o DN, Real Santa Eulália, Bela Vista, Cerro Alagoa e Alfagar (Albufeira), Pestana Alvor Praia, em Alvor (Portimão) e Hotel Hilton, em Vilamoura (Loulé), são apenas algumas das unidades hoteleiras alvo de assaltos nos últimos meses no Algarve. Muitos dos responsáveis destas unidades afirmaram ao DN que irão agora reforçar a segurança através de empresas do sector. "Mesmo nesta altura do ano, em que o movimento turístico é fraco, justifica-se tomar medidas para tranquilizar os clientes. É preciso ter os hotéis e empreendimentos turísticos mais seguros, com mais pessoas a vigiá-los", disse um um gestor hoteleiro. O investimento vai obrigar as empresas de segurança a contratar mais pessoal.

Com 26, 41 e 45 anos, os homens foram presentes ontem a tribunal e ficaram em prisão preventiva. De acordo com as autoridades, os suspeitos preparavam-se para sair do país, nem ofereceram resistência. Esta detenção, que surgiu na sequência de quatro meses de investigações da GNR, possibilitou a apreensão de 33 mil euros em dinheiro, seis telemóveis, onze relógios de elevado valor, 86 peças em ouro, 29 moedas de prata de colecção, uma balança de precisão, documentos de identificação falsos e uma arma eléctrica

Nos assaltos a quartos dos hotéis, os três homens - um argelino e dois franceses (os pais destes nasceram na Argélia), com dupla nacionalidade, e sem cadastro conhecido, nomeadamente noutros países - actuavam entre as 15.00 e as 17.00 e "faziam-se passar por turistas, usando roupas de marca", explicou ontem, em conferência de imprensa, o comandante, Marco Henriques.

Prudência na forma de agir era o que não faltava ao trio de assaltantes, um dos quais tinha por missão fazer o "reconhecimento" do local. "Utilizavam métodos bastante cuidados. Estavam constantemente a trocar de viaturas, sendo todas elas alugadas. Tentavam não deixar vestígios no local do crime e trajavam como turistas para passarem despercebidos na recepção dos hotéis", referiu o militar.

Em 15 a 20 minutos, "eram capazes de, num hotel, concretizar quatro ou cinco furtos em diferentes quartos". Usavam ferramentas simples que transportavam numa mala à tiracolo. E enquanto um deles vigiava no corredor a eventual presença de funcionários do hotel ou de turistas, os outros dois entravam nos quartos para furtar.

Os últimos assaltos ocorreram no fim-de-semana em duas unidades hoteleiras de Alvor (Portimão) e numa vivenda de luxo na zona de Olhos de Água, em Albufeira. Ali, a vítima do trio franco-argelino foi um casal português, que ficou sem 20 mil euros guardados em casa no domingo, como receita do seu comércio. Isto porque os assaltantes conheciam as movimentações e os hábitos.

Lisboa e Espanha eram os locais para onde normalmente se deslocavam, mas as autoridades desconhecem, para já, quaisquer assaltos nessas zonas cometidos pelos suspeitos agora detidos. Também não existem indícios de que se trate de indivíduos com ligações terroristas para eventuais financiamentos de redes internacionais.


Ler notícia completa em: http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1429549

Comentário do Leitor

A propósito da Crónica de Domingo - "Em defesa do Muro de Berlim"

Que encanto este desencanto (de comentário) que me precede!
Tem toda a razão... nas comparações que faz. O que fica (des)dito será o quê? Compara-se ele próprio aos infernos que nos precederam e que têmos mesmos nomes que ele tanto gosta! Sirva-lhe de proveito.

Quer ver o que dá o seu paleio pré-histórico? Um reaccionário de "analfabetos" que nem "indegência" alfabetiza como deve ser!
Um hipócrita que usa o conceito a torto e a direito como se a nossa conveniência discursiva, ideológica e tagarelas desse sentido à palavra e à linguagem que usa. Demagogo...

Olhe, vá estudar e depois fale de história, de política, mas não se esqueça, por amor a si próprio, de ver o que significa LIBERDADE com RESPONSABILIDADE e com AUTODETERMINAÇÃO.
Vá ao dicionário ver a palavra MURO. E já agora, o que faz V.Exª aos seus animaizinhos de estimação? Não tem? Não estima nada nem ninguém?

Tenha você vergonha e mostre-se digno daqueles que ainda publicam as suas baboseiras. Sempre houve "Velhos do Restelo" neste país.
Ao menos trate quem vem a este blogue com algum sentido de alegria e de bom gosto, com os direitos que V Exª merece, mas nós acima de tudo. Não nos faça a nós o mesmo que aplica ao cão de Obama.

Somos gente, mesmo que não gozemos dos seus ideais.
Não. Não ficamos dentro dos seus muros. Já de lá saímos e a experiência que temos feito fale por si.
Quando escrever não se esqueça de ir colocando ao lado as palavras que não usa. Pode ser que assim se dê conta do valor que não tem.

Imagino-o como uma triste figura. Não sei porquê?
Mas com este palavreado e linguagem....

domingo, 22 de novembro de 2009

Crónica de Domingo

Em defesa do Muro de Berlim

"Sem o seu derrube, onde estariam as cores, onde o movimento de massas, por onde andaria a emoção de que carecem os grandes eventos da história - como o assassinato de César, a queda da Bastilha, ou o 25 de Abril?"

Que bom que o Muro de Berlim foi construído. Se não tivesse sido construído, não teria sido destruído. E, se não tivesse sido destruído, como assinalar no curso da história, da maneira vistosa e dramática que merece, esse evento capital que foi o desmoronamento do mundo comunista? Com que cenário? Com que povo? Com que artefacto, concreto como um muro, enorme, contra o qual investir? Ainda bem que existem os eventos simbólicos a marcar a marcha da história. Sem eles, estaríamos condenados aos "processos", essas fluídas cadeias de circunstâncias políticas, relações sociais, estados psicológicos, oscilações económicas, percepções e acidentes que, temperadas por inevitáveis doses do acaso, conduzem a corrente da história, de forma frequentemente misteriosa, para este ou aquele caminho. Actos como o derrube do muro que dividia a antiga capital do Reich dão visibilidade à história. Servem de farol contra a falta de rosto, de cor e de volume dos "processos".
O derrube do Muro de Berlim é um acontecimentoo da mesma natureza da queda da Bastilha, em França. Claro que não foi a investida contra a mal-afamada fortaleza da Rua Saint-Antoine, em Paris, ainda mais que naquela data já andava meio desactivada, como prisão, e não continha senão sete escassos prisioneiros. Não foi isso que determinou a Revolução Francesa. Mas, sem o episódio da Bastilha, como dar corpo e - de fundamental importância - como dar uma data ao conjunto de transformações ocorrido naquele período da vida francesa? A própria história portuguesa contém um exemplo similar - a "queda do Quartel do Carmo", onde se refugiou o governo marcelista na abrilada. O evento salvou o advento da dita "revolução dos cravos" do destino de, submerso num mar de vários "processos" de origem, apresentar-se sem corpo e sem data. Os actos simbólicos têm o efeito de agarrar o tempo e forçá-lo a uma paragem, majestosa e densa como uma escultura. Eles dão inteligibilidade à história da mesma forma como a sucessão das estações dá inteligibilidade ao ano.
A queda do Muro de Berlim, no dia 9 de novembro de 1989, permitiu que, houvesse este mês uma festa na capital alemã e comemorações pelo mundo fora, pelos vinte anos da data. Sem ela, como comemorar a derrocada do império soviético e as tiranias do Leste Europeu? Uns indicariam as greves conduzidas na Polónia pelo movimento Solidariedade de Lech Walesa. Outros inclinar-se-iam para as manifestações que compuseram a "Revolução de Veludo" da Checoslováquia. Mas qual das greves e qual das manifestações, se foram tantas e várias? Mais seguro seria apontar para o dia da ascensão de Mikhail Gorbachev à secretaria-geral do Partido Comunista - 11 de março de 1985. Mas, se foi possível a Gorbachev ascender ao mais alto cargo da hierarquia soviética, e com ele o impulso reformista que fermentava no interior do regime, é porque algum tipo de fissura já minava a carapaça do oco poder comunista.
E minava mesmo. A União Soviética já não tinha fôlego para sustentar a corrida armamentista imposta pela concorrência com os Estados Unidos. Além disso, vivia num atoleiro sem saída para o seu envolvimento militar contra os talibans do Afeganistão. Além disso, já ficara irremediavelmente para trás do Ocidente nas conquistas tecnológicas. O seu sistema económico mostrava-se pateticamente incompetente no provimento dos bens de consumo de que carecia a população. Pronto. Estamos no emaranhado de fios que tecem os "processos", e tantos fios acharemos quanto mais nos detivermos a procurá-los. O historiador inglês Timothy Garton Ash lembrou-se da "lei da cornucópia infinita", formulada por outro historiador, o polaco Leszek Kolakowski. Para qualquer evento, segundo a lei de Kolakowski, é possível encontrar um número infinito de explicações.
Onde, se nos detivermos nos processos, a cenografia, onde as cores, onde o movimento, onde a emoção de que carecem os grandes eventos da história - qual o assassinato de César, o martírio de Joana d’Arc, a batalha de Waterloo? Precisamos de teatro, esta é que é a verdade, como de ar para respirar. Dai-nos uma cena forte, esmagadora, e com ela marcaremos o tempo, de forma a tirá-lo da uniformidade sem graça e sem sentido do seu fluxo contínuo. No campo das miudezas quotidianas, o momento do "parabéns a você" é o teatro que assinala a passagem de mais um ano de vida. No campo das grandiosidades históricas, o muro forneceu o cenário, e as pessoas que trepavam para cima dele, dançavam e arrancavam pedaços de cimento, num misto de levante e festa popular, e assim compuseram a dramaturgia de que carecia um evento daqueles: o portentoso momento da queda da fortaleza comunista.
Carlos Ferreira
algarve.reporter@live.com.pt

sábado, 21 de novembro de 2009

Foto da Semana

Os Direitos humanos em Cuba


Na terra de Fidel, os blogs tem vida negra: "Eu achei que não sairia viva"

Quem vê a cubana Yoani Sánchez, conhecida blogueira por driblar a censura, automaticamente se contrai só de pensar no sofrimento a que o seu corpo frágil, de apenas 49 quilos, foi submetido enquanto era espancada por três brutamontes dentro de um carro. Na tarde da sexta-feira passada, Yoani estava a caminho de uma quase impossível manifestação de protesto em Havana quando foi atacada por agentes da polícia política. Sofreu ameaças e espancamentos antes de ser jogada na calçada de um bairro pobre e longínquo do centro da cidade. Yoani escreve há dois anos sobre as dificuldades de viver na ilha de Fidel. no blog Generación Y - www.desdecuba.com/generaciony - e é autora do livro "De Cuba, com Carinho" (editado em português pela Contexto). Vive sob vigilância, mas nunca havia sido fisicamente atacada. Numa mesagem, ela descreve o ocorrido e com a habitual coragem, manda um recado ao "general" – Raúl Castro. De muletas, sequela do espancamento que a imobilizou em casa, pediu a uma amiga que levasse o relato em uma pen drive até um ponto de acesso à internet para enviá-lo por e-mail.


De muletas, Yoani Sánchez, em casa, depois de ser agredida: "Durante vinte minutos, nos espancaram sem parar"

"Não era uma sexta-feira qualquer. As comemorações do vigésimo aniversário da queda do Muro de Berlim estavam na ordem do dia, e um grupo de jovens artistas cubanos planeava uma passeata contra a violência naquele dia. A tarde era cinza numa cidade onde quase sempre brilha um sol inclemente, e que nos faz caminhar colados às paredes para beneficiarmos da sombra. Estavam comigo Claudia Cadelo e Orlando Luís Pardo, dois autores de blogs que recebem milhares de visitas em cada semana. Enquanto andávamos, contei a eles sobre uma desconhecida que, dias antes, havia se aproximado de mim, e perguntado: "Você não tem medo?", em referência, claro, ao facto de que digo livremente as minhas opiniões num país onde o governo detém o monopólio da verdade. Meus amigos sorriram quando narrei a eles a resposta que dei à transeunte angustiada: 'Meu maior temor é ter de viver com medo'. Não imaginava maquele momento que em poucos minutos eu viveria o terror de um sequestro e veria o rosto da impunidade policial na sua forma mais dura.
Eu caminhava pela Avenida dos Presidentes, em Havana, com a intenção de participar na demonstração pacifista convocada pelos jovens. À altura da Rua 29, a uns 300 metros de onde estavam os manifestantes, um carro da marca Geely, de fabrico chinês, cor preta e placa amarela, de uso privado, parou diante de nós. Três homens em trajes civis mandaram-nos entrar no automóvel. Não se identificaram nem mostraram um mandado de prisão. Eu recusei-me a obedecer. Disse que, como não tinham ordem judicial, seria um sequestro. Depois de uma breve discussão, um deles chamou alguém pelo celular, pedindo orientações. Imediatamente, os três começaram a tratar-nos com violência para que entrássemos no carro. Enquanto nos empurravam, os homens do automóvel negro usaram o celular outra vez e uma viatura da polícia aproximou-se. Pensei que os policias nos salvariam. Pedi ajuda a eles, explicando que estávamos sendo atacados por supostos sequestradores. Os homens que estavam à paisana então deram ordens aos policiais para levar Claudia Cadelo e outra amiga que estava conosco. Eles obedeceram e ignoraram o pedido de ajuda que eu e Orlando fazíamos. As pessoas que observavam a cena foram impedidas de prestar ajuda, com uma frase que resumia todo o fundo ideológico da cena: 'Ninguém se meta. Eles são contra-revolucionários'. Fazendo uso de toda a força física e de um evidente conhecimento de artes marciais para nos dominar, obrigaram-nos a entrar no carro. Comigo empregaram especial violência, enfiando-me de cabeça para baixo e mantendo-me imobilizada com um joelho sobre o peito.
Dentro do veículo e durante cerca vinte minutos, os sequestradores nos espancararam sem parar. Frases de mau presságio saíam da boca daqueles três profissionais da intimidação e da violência: 'Yoani, isto é o teu fim', 'Não vais escrever nem fazer mais palhaçadas', ou 'Acabou a brincadeira'.
Achei então que não sairia dali viva. Tentei escapar pela porta, mas não havia maçaneta para abrir. A certa altura, o carro parou. Eu já tinha perdido a noção do tempo. Do lado de fora, caía a noite. Finalmente, depois de um verdadeiro massacre, ambos fomos jogados em plena via pública, longe do lugar onde se realizava a passeata contra a violência.
Por causa dos golpes desferidos por esses profissionais da repressão, estou com a face esquerda inflamada. Tenho contusões na cabeça, nas pernas, nos glúteos e nos braços, além de uma forte dor na coluna, que me obriga a caminhar com muletas. Fiz uma consulta médica, mas não quiseram redigir um exame de corpo de delito sobre os maus-tratos físicos. A médica teve de me atender na presença de um funcionário que estava ali apenas para me vigiar. Uma radiografia mostrou que não havia traumas internos, apesar dos sinais exteriores das pancadas. Recebi apenas algumas recomendações para a minha recuperação.
Eu já me sinto fisicamente melhor e desde sexta-feira tenho uma ideia constante. As autoridades cubanas acabam de compreender que, para silenciar uma blogueira, não podem usar os mesmos métodos com os quais conseguiram calar tantos jornalistas. Ninguém pode despedir os impertinentes da web nem lhes prometer umas semanas na Praia de Varadero ou presenteá-los com um Lada da ex-RDA. Muito menos podem ser cooptados com uma viagem para o Leste Europeu. Para calar um blogueiro, é preciso eliminá-lo ou intimidá-lo. Essa equação já começou a ser entendida pelo estado, pelo partido e pelo general. E a liberdade um dia triunfará."

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Crónica de Espadas

A mudança

A frase é de Gandhi: “sejamos nós a mudança que queremos ver no mundo”.

Não, não me esqueci do que aprendi em jornalismo: jamais começar um texto citando alguém: Gandhi, Einstein ou Chaplin se nós queremos ser levado a sério neste mundo cínico. Sim, muita gente fala de coisas bonitas, mas eles não são “pragmáticos”. São “ingénuos” (ou falsos), desligados das realidades deste mundo e do mercado, ignorantes (ou coniventes) da sujeira que é a vida política, sonhadores, poetas, imbecis.

Mas não resisti. Lembrei de Gandhi quando estava a ler um outro autor, Clay Shirky, um teórico que se dedica o seu tempo a tentar entender as mudanças que estão acontecer no mundo de hoje (e autor de um óptimo livro). Shirky tem uma tese interessante: a de que, quando uma grande revolução acontece, as velhas estruturas desabam muito rapido (lembrem-se do 25 de Abril), mas demoram anos, às vezes décadas, para as novas estruturas surgirem (quando Gutenberg inventou a imprensa, os escribas da época protestaram durante décadas pela baixa qualidade da escrita, que isso provocou).

É exactamente isso o que está acontecer hoje em dia. Institiuições antigas, aparentemente eternas, estão a desabar perante nós – os bancos e os grandes jornais do mundo estão em crise de identidade, a indústria automobilística foi obrigada a reinventar-se, os governos têm que redefinir a sua actuação, as profissões mudam todos os dias. Estamos a viver dias difíceis e muitos de nós sentimo-nos como que perdidos, sem referências, sem ter onde e como acreditar. As ideologias do século XX transformaram-se em teorias sem conexão com o mundo real.

Isso é tremendamente angustiante. De repente, tudo aquilo em que acreditávamos que era sólido está a evaporar-se. O mundo está a mudar tão rápido, todos os dias, hora a hora, que é muito difícil ter crenças objectivas e que não sejam cerceadas pelo caminho. É difícil saber o que é certo e o que é errado. E os cínicos e hipócritas – essa gentinha que adora apedrejar qualquer um que esteja bem intencionado – fazem a festa no meio da confusão desta revolução social que é muito mais económica.

Mas o facto é que viver no meio de uma revolução, se por um lado é complicado, é também uma pequena oportunidade. Significa que vivemos uma época em que é possível construir coisas novas, de criar, de propor. Não é hora de ser cínico. Não temos tempo para isso. A nossa geração tem um papel fundamental: o de criar as estruturas sobre as quais assentará o nosso novo modelo de sociedade.

Esse trabalho – o de reconstruir um mundo novo – é um empreendimento grandioso, mas colectivo. Neste mundo de hoje, absurdamente fragmentado, no qual qualquer pessoa tem acesso ao resto do mundo via internet, todos têm um papel – não apenas os políticos, os empresários, os intelectuais, os “líderes”. Todos nós devemos estar envolvidos no projecto colectivo e inevitável de tentar mudar para melhor o mundo em que vivemos.

O mais divertido é que não há uma cartilha, uma receita para seguir. Ninguém sabe para onde ir. Depois da queda do muro de Berlim, do colapso do clima (ambiente) e da crise mundial, resta apenas uma certeza: a de que precisamos de um novo rumo. Que rumo é esse? Cabe a cada um de nós propor. O resultado, imprevisível, será a combinação de biliões de pequenas e grandes contribuições.

O nosso papel então é imaginar o que queríamos que o mundo fosse e trabalhar para implantar essa visão. No final, certamente o mundo não vai ser como eu quero, ou como o leitor quer. Mas cada um de nós tem a capacidade de empurrar um pouco a História para o lado que prefere. Há gente a fazer isso a tempo inteiro, trabalhando por uma causa, por uma ideia, por uma inovação, por um projecto. Há gente a fazer isso de noite, depois de voltar do trabalho. Há gente a fazer isso nas horas de lazer. Há gente a fazer isso nas relações pessoais, na vida em família, no bairro, na associação, na rua, no trânsito.Há gente a fazer coisas imensas, importantes, transformadoras. Gente que colabora com o pouco que está ao seu alcance, mas que junto a outros, fáz muito. Eu, por exemplo, sinto-me bem ao deixar o carro de lado na grande cidade, durante a semana, não engrossando a enorme fila de trânsito, e andar de transporte público, porque sei que, estatisticamente, quanto menos carros houver na rua, mais seguro o trânsito será para todos os peões. Temos esse poder: o de alterar a paisagem. Cada novo peão na rua e menos carros, melhora a vida dos outros.

É uma contribuição minúscula, mas é isso que nos resta neste mundo, e devíamos ficar satisfeitos. É uma boa notícia. Não há mais grandes ideologias. Não há mais grandes autoridades. Só o que há é isso: um conjunto de biliões de pessoas, cada uma delas a tentar mudar um pouquinho a paisagem. Se a maioria de nós ficar imobilizada pela ansiedade e pelo olhar crítico dos cínicos, distraído com o acenar de cabeça dos hipócritas, construiremos muito pouco. Se cada um fizer algo, ainda pouco que seja, teremos boas chances de ficarmos orgulhosos do resultado. Caso contrário, o mundo fica em poder dos cínicos e dos hipócritas.

J.D. Guerreiro

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Economia cai ainda mais

Recuo de 2,7% e consumo das famílias cai 0,9%

A compra de bens duradouros como carros e electrodomésticos deverá recuar 14,3%, segundo previsões do Banco de Portugal, hoje divulgadas

A economia deverá contrair 2,7% em relação a 2008 e o consumo das famílias na compra de bens e serviços caiu 0,9%, com a compra de bens duradouros, como carros e electrodomésticos a registar uma queda de 14,3%, de acordo com as previsões do boletim de Outono que acaba de ser divulgado pelo Banco de Portugal.
Com o investimento a cair 14,2% - em relação a 2008 – as exportações do País deverão regredir 13,1%. A causa para a queda da economia acaba por ser a procura interna (consumo das famílias e investimento), já que o comércio externo teve um impacte positivo, explicado por uma maior queda (em termos absolutos) das importações.
Também os gastos do Estado (consumo público) animou a economia ao aumentar 2,1%, face a 2008. O défice externo deverá estacionar nos 8,6% doPIB, inferior ao 10,5% registados em 2008. Esta redução do défice está associado à descida das taxas de juro, o que cabou por diminuir o défice da balança de rendimentos.
Só em Janeiro, com o boletim de Inverno, o Banco de Portugal divulga previsões para 2010.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Opinião do Leitor

A propósito da Crónica de Domingo

Ao comentário anónimo do "igoísmo", se me permite, respeitosamente, medite bem no que pensa dos outros e, sobretudo, quando lê um texto tente segui-lo desde a tecelagem do linho até às palavras que acabam por identificar a nossa roupagem. Não me parece que o Sr ou Sra tenha sido feliz. É preciso termos calma, meus caros. Afinal, alguns dos que "passaram as passas do Algarve" ficaram com as passas na bílis.
Porque o que eu entendo do texto do C Ferreira é muito. Mas só para aliviar, cá fica. Que grande diferença será essa da riqueza de certos povos, como o Brasil, Angola, e a riqueza do Algarve? Não dá pra entender? Explico. Aqui,todos os que por cá nasceram, um dia foram descobertos pelo sol e pela praia. Antes emigraram como quaisquer outros, de outros lugares e culturas. O raio do sol e da praia lembrou a alguns (de fora!) que isto representava mais do que todo o ouro do mundo....
Agora vivem por tudo e por nada, sem saber lá muito bem o que quer dizer riqueza, pobreza, escrever "egoísmo", etc... a Cultura do novos ricos, dos pequeno-burgueses é assim. Projectam nas suas vidas a imagem dos ricos que sempre viram.
Portanto, meu caro C. Ferreira, chegue-lhes prá frente. É que afinal o poder e o saber não se têm dado lá muito bem por este reino dos Algarves... Já Hitler conseguiu todo o poder político e bélico que quiz, bem como algumas façanhas simbólicas para uso cultural próprio. Mas tudo ficou, UM DIA, onde ficou. Com muita má e triste memória para todo o mundo.
Dos mandões actuais no Algarve (são vários) há quem sobressaia pelo poder do dinheiro, do negócio com as pessoas, da influência e culto da personalidade... Não sei, meus caros, que raio de gente em pleno século XXI ainda pode adorar estes cultos de personalidade, ainda por cima política.
Somos todos um pouco reles, por mais poder que detenhamos.
A. Ramos

domingo, 15 de novembro de 2009

Crónica de Domingo

Uma potência sim, mas analfabeta

"A verdadeira democracia tem de oferecer a todos o direito de saber ler e escrever, pensar, questionar e saber escolher, com consciência e conhecimento"

Alguns dos comentários à minha última crónica (e na falta de conhecimento de temas actuais em Portugal) fazem-me escrever hoje sobre o Brasil, este polémico continente repleto de contrastes, perigos e maravilhas, de um povo antes tão querido de Portugal, e hoje temido por causa dos problemas sociais que todos nós conhecemos, que transbodaram as suas fronteiras.
Segundo li aqui, uma pesquisa do confiável IBGE, o Brasil está num vergonhoso lugar entre os países da América Latina, no que diz respeito à alfabetização. É verdade. E eu diria mais: a falta de sentido de profissionalismo e competência prolifera nos sectores mais diferentes, desde o privado ao estatal. O que lhes faltou e tanto lhes falta ainda, pode dizer-se que tem sobrado em ufanismo. Não são os melhores, mas são dos que possuem maiores riquezas naturais, não são invulneráveis, mas são um país emergente cuja crise económica internacional pouco se fez notar (a não ser na subida dos preços de alguns bens, imposto pelo capitalismo de sempre, com particular relevância para os turistas), com riquezas enormes ainda nem descobertas, e outras mal administradas. São um povo resistente e forte, capaz de uma alegria e uma fraternidade tamanha, que as muitas quadrilhas de gatunos, o banditismo e o narcotráfico, bem como a assustadora violência actuais não conseguem diminuir o valor e o progresso. Uma terra onde a riqueza vive de braço dado com a miséria. Um povo que trabalha duro e com uma rara capacidade de improvisação positiva, esperança e honradez.
O sonho de morar fora daqui para escapar já não lhes vale nos dias de hoje. Na velha e sisuda Europa não há um sol como este. Recordo o meu espanto pela intensa luminosidade desta terra na primeira estadia por cá, num longínquo verão dos anos 70. Na Europa o sol é oblíquo e pálido. Aí não se ri, não se abraça como aqui. Trabalha-se mais e ganha-se mais, é verdade. A pobreza por aí é menos pobre porque, se fosse miserável como por cá, morreriam todos de frio na primeira borrasca. O salário do fundo do desemprego é tão bom que, infelizmente, muitos decidem viver só com ele: o mercado de trabalho aí também é cruel, e com os estrangeiros, nem se fala. Mas em muitas outras coisas os brasileiros são inacrediávelmente muito melhores.
Mas é um país analfabeto. Alfabetizado não é, já disse e escrevo frequentemente, aquele que sabe assinar apenas o seu nome, mas quem assina um documento que o leu e compreendeu. A verdadeira democracia tem de oferecer a todos esse direito, pois ler e escrever, como pensar, questionar e escolher, é um direito. É uma questão de dignidade. Também em Portugal, quando eu era estudante universitário, na década de 70, já recebíamos nas faculdades vários alunos que mal conseguiam escrever uma frase e expor um pensamento completo e claro claro. "Eu sei o que é e o que quer dizer, mas não sei dizer nem escrever isso" éra uma desculpa pobre e esfarrapada. Não é preciso ser intelectual, mas deve-se poder redigir ao menos um breve texto decente e claro. É preciso ser-se bem alfabetizado, isto é, usar o instrumento de leitura e expressão completo, falado e escrito, dentro do nosso nível de vida e do nível de vida de cada grupo, e nem mesmo nos dias de hoje isso ainda acontece totalmente em Portugal.
Aí, como aqui mas em maior escala. Para isso, é essencial uma boa escola desde os primeiros anos, dever inarredável do Estado. Não me digam que todas as comunidades têm escolas e que estas têm o necessário para um ensino razoável, para que até o mais pobre e esquecido no mais esquecido e pobre recanto possa tornar-se um cidadão inteiro e digno, com acesso à leitura e à escrita, isto é, à informação. Uma pessoa capaz de fazer boas escolhas de vida, pronta para se sustentar e que, na grave hora de votar, saiba bem o que está a fazer. Pelo menos, numa questão de responsabilidade democrática, o Brasil está bem mais defendido que Portugal: aqui, é obrigatório todo e qualquer cidadão votar. Por outro lado, enquanto alardeiam façanhas, descobertas, ganhos e crescimento económico, a situação no campo da educação está cada vez pior. Muito menos pessoas se alfabetizam de verdade; dos poucos que chegam ao 2º grau e dos pouquíssimos que vão parar à universidade, muitos não saem de lá realmente formados. Entram numa qualquer profissão incapazes de produzir um breve texto claro. São desinteressados da leitura, falam e expressam-se mal. E a escreverem? Nem se pode comentar por uma questão de respeito pela ignorância alheia. Na generalidade, não conseguem informarem-se nem questionar o mundo. Pouco lhes foi dado, e pouquíssimo lhes é exigido.
A única saída para tamanha calamidade social que grassa pelo Brasil, está num maior interesse e esforço do Governo pelo que há de mais importante num país: a Educação. Aqui, como aí. E isso só vai começar quando o Governo Federal der maiores orçamentos aos Governos Estaduais. Só assim se poderá de facto mudar o Brasil, o resto é conversa fiada. Investir nisso significa criar mais oportunidades de trabalho: muito mais gente capacitada a obter um salário decente. Significa exigir e obter saúde: gente mais bem informada não adoece por ignorância, isolamento e falta de higiene. Se ao Estado cabe ajudar o cidadão a ser capaz de saber, entender, questionar e escolher a sua vida, é nas famílias, quando podem comprar livros, que tudo começa. "Quantos livros você tem em casa, quantos já leu este mês? E o jornal de hoje, tem?", pergunto eu, quando me dizem que os filhos não gostam de ler. Família tem a ver com moralidade, atenção e afecto, mas também com os necessários instrumentos para que os filhos possam assumir um lugar decente no mundo, e grande parte do povo brasileiro não está motivado para isso.
Tal como no Brasil, alguns de nós em Portugal, nascemos perante a batalha da alfebatização, e nela vivemos. Mas com ela também fazemos parte de um país que nos deve, a todos, uma educação óptima. Ela trará consigo muito de bom, e tudo aquilo que nos falta. No caso deste imenso continente, isso vai com certeza demorar a chegar. Porém, o Brasil de hoje, já nada tem a ver com aquele de há uma década atrás. O visível crescimento económico atropelou a Educação, e fará deste país nos próximos anos uma das maiores potências económicas, mas também de ignorantes.
Carlos Ferreira

algarve.reporter@live.com.pt

sábado, 14 de novembro de 2009

Fim de Semana

Apocalipse popular
O fim do mundo em 2012

As profecias voltam ao cinema: Os planetas, as estrelas, o calendário Azteca e, é claro, uma superprodução de Hollywood reavivam a ideia aterrorizante do apocalipse e levantam uma questão: por que continuamos a acreditar em profecias apocalípticas apesar de todas elas terem fracassado redondamente?

O escritor Patrick Geryl tem 54 anos, já escreveu uma dezena de livros, nunca se casou, não tem filhos e actualmente anda muito ocupado a preparar-se para o fim do mundo. Na semana passada, esteve na Sierra Nevada, no sul da Espanha, acompanhando uma equipe de televisão do Canadá, numa vistoria às habitações que estão a ser ali construídas. São bunkers ocos de cimento capazes de resistir ao cataclismo que, acredita Geryl, destruirá o planeta Terra no dia 21 de dezembro de 2012. "Queremos um lugar a uns 2.000 metros acima do nível do mar", explica. Ele e o seu grupo pretendem levar 5.000 pessoas – que pagarão cada uma delas 1 milhão de dólares, para um local que resistirá aos horrores do apocalipse. Será o último dia do resto da humanidade, acredita Geryl, um dia para o qual ele se vem preparando desde a adolescência, quando, aos 14 anos, na histórica cidade belga de Antuérpia, começou a interessar-se pelo assunto lendo livros de astronomia. Ao voltar de Espanha, Geryl ocupa-se agora em fazer a relação os itens que devem ser levados para o bunker antiapocalipse. Na lista colectiva, havia já 348, faltando ainda incluir os medicamentos. Na de uso individual, 86.
Depois da II Guerra Mundial, a ideia do apocalipse passou a ter duas fontes – a religião e a ciência.
O ano de 2012 tornou-se o centro de gravidade do fim do mundo por uma confluência de achados proféticos. Primeiro, surgiu a tese de que a Terra será destruída com o regressso do planeta Nibiru em 2012. Depois, veio ao conhecimento que o calendário Azteca, uma das esplêndidas civilizações da América Central pré-colombiana, acaba em 21 dezembro de 2012, sugerindo que se os aztecas, tão entendidos em astronomia, encerraram as suas contas dos dias e das noites nessa data, é porque depois dela não haverá mais para contar. Posteriormente, apareceram os eternos intérpretes de Nostradamus e, em seguida, vieram os especialistas em mirabolâncias geológicas e astronómicas com um vasto cardápio de catástrofes: reversão do campo magnético da Terra, mudança no eixo de rotação do planeta, devastadora tempestade solar e o derradeiro alinhamento planetário em que a Terra ficará no centro da Via Láctea – tudo em 2012 ou em 21 de dezembro de 2012.

CONFIANÇA NA CATÁSTROFE

Patrick Geryl, é autor de três livros sobre o fim do mundo em 2012: ele não encontra com outra hipótese

Com tantas sugestões, a profecia saltou para as ruas. Esta semana, no dia 13 de novembro, teve lugar a estreia mundial de 2012, uma superprodução de Hollywood que conta a saga dos que tentam desesperadamente sobreviver à catástrofe final. No site da Amazon, há 275 livros sobre 2012. Nos Estados Unidos, já existem lojas que vendem produtos para o apocalipse. Os produtos mais comercializados são pastilhas purificadoras de água e potes de magnésio, bons para acender o fogo. É sinal de que os compradores estão preocupados com água e fogo, num regresso ao tempo das cavernas. Na Universidade Cornell, que mantém um site sobre curiosidades do público a respeito de astronomia, disparou o número de perguntas sobre 2012. Há aqueles que se divertem, pois não acreditam na profecia. Entre os que acreditam, os sentimentos vão da tensa preocupação, como é o caso de Patrick Geryl, autor de três livros sobre 2012, todos publicados em português, até ao pavor incontrolável. O fim do mundo é uma ideia que nos aterroriza – e, nesse formidável paradoxo que somos nós, também pode ser a ideia que mais nos consola. Por isso é que ela existe.
No inventário dos fracassos humanos, talvez não haja aposta tão malsucedida como esta de marcar uma data para o fim do mundo. Falhou 100% das vezes, mas continua a resistir e espalha-se, resistindo ao tempo, à razão e à ciência. As tentativas de explicar esse fenómeno são uma viagem fascinante pela alma, pela psique, pelo cérebro humano. Uma das explicações está no facto de que o nosso cérebro é uma máquina programada para extrair sentido do mundo. Assim, somos levados a atribuir ordem e significado às coisas, mesmo onde tudo é casual e fortuito. As constelações no céu, por exemplo, são uma criação mental para organizar o caos estelar. Ao olharmos as constelações de Orion ou Andrómeda, encontramos ordem e sentido. O dado complicado é que a vida, no céu e na terra, deve muito mais às contingências do acaso do que ao determinismo. O espermatzoide que fecundou o óvulo que gerou Albert Einstein foi um produto do acaso, resultado de uma disputa entre espermatzoides resolvida por milésimos de segundo. Resumindo: assim como aconteceu, poderia não ter acontecido.
Recuando no tempo, a própria humanidade, analisada do ponto de vista científico, é fruto do acaso. Por um acidente, um peixe pré-histórico desenvolveu barbatanas que, à imitação de pernas ou patas, lhe permitiram enfrentar a gravidade da Terra e, assim, por acaso, viabilizou o desenvolvimento de vertebrados fora da água. Bilhões de anos depois, cá estamos nós, bípedes, inteligentes, comendo um gelado de morango, descobrindo a estrela mais antiga e deliciando-nos com os filmes de Fred Astair ou com Elizabeth Taylor deslumbrante em Cleópatra. Tudo por acaso. A preponderância do aleatório sobre o determinado pode dar a sensação de desesperança, de que somos impotentes perante todas as coisas. Talvez nisso residam a beleza e a complexidade desta vida, mas o facto é que o cérebro está mais interessado na ordem das coisas do que em belezas complexas. Por isso, quando não vê significado nas coisas naturais, ele salta para o sobrenatural. "Nascemos com o cérebro desenhado para encontrar sentido no mundo", escreve o filósofo e psicólogo Bruce Hood, da Universidade de Bristol, na Inglaterra, autor de Supersense: Why We Believe in the Unbelievable “Supersentido: Por que Acreditamos no Inacreditável”. "Esse desenho às vezes leva-nos a acreditar em coisas que vão além de qualquer explicação natural", acrescenta.
O achado de Hood foi descobrir que as crenças talvez não sejam fruto nem da religião nem da cultura, mas uma expressão de como o cérebro humano trabalha. É o que ele chama de "supersentido". É o supersentido que nos leva a bater na madeira três vezes quando somos supersticiosos, a dar valor afectivo a um simples objecto que não vale nada, ou a conversar com Deus. Segundo o filósofo, “a religião seria uma criação mental através da qual o cérebro atende a sua necessidade por um sentido. O apocalipse, nesse caso, é uma saída brilhantemente engenhosa. Explica duas questões que atormentam a humanidade desde sempre: o significado da vida e a inevitabilidade da morte. Somos a única espécie com consciência da própria morte e, no entanto, não sabemos o significado da vida. Afinal, por que estamos aqui? A pergunta, em si, revela a nossa busca por um sentido, devido à nossa dificuldade de conviver com a possibilidade de que, talvez, não estejamos aqui por alguma razão especial. O apocalipse é uma resposta. Está descrito nos seus mínimos e horripilantes detalhes no Livro do Apocalipse, escrito pelo profeta e evangelista João, por volta do ano 90 da era cristã, quando estava preso, perseguido pelo Império Romano”.

OS PLANOS DIVINOS

As pinturas de Michelangelo na Capela Sistina retratando o Juízo Final: expressões do domínio da Igreja Católica sobre o destino e o ciclo do tempo

O começo do fim do mundo, segundo as profecias de João, será anunciado por sinais tenebrosos: “um céu negro, uma lua cor de sangue, estrelas desabando sobre a Terra e uma sucessão de desastres varrendo o planeta na forma de terremotos, inundações, incêndios, epidemias. O Anticristo então dominará a Terra durante sete anos, no fim dos quais Jesus Cristo descerá dos céus com um exército de santos e mártires – e vencerá Satã, a besta. Depois de 1.000 anos acorrentado, Satã conseguirá se libertar e forçará Jesus Cristo a travar uma segunda batalha, a terrível batalha do Armagedom. Derrotado Satã, todos nós, vivos e mortos, nos sentaremos no banco dos réus do tribunal divino. Os bons irão para o paraíso celestial. Os maus arderão no fogo eterno”. É uma narrativa tão magicamente escatológica que Thomas Jefferson, o terceiro presidente dos Estados Unidos, a apelidou de "delírio de um maníaco". Bernard Shaw, o grande teatrólogo irlandês foi mais violento, disse que era o "inventário das visões de um drogado". Delírio ou visões, o Livro do Apocalipse explica tudo. O professor Ralph Piedmont, do Loyola College, em Maryland, especialista em psicologia da religião, afirma: "O Apocalipse de João explica a morte, ao informar que vamos ressuscitar, e dá sentido à vida, ao dizer que é uma provação".
Subsidiariamente, o apocalipse atende a outra necessidade humana, a de acreditar num mundo regido por uma ordem moral. Os historiadores atribuem o surgimento da visão apocalíptica ao persa Zoroastro, ou Zaratustra, que viveu uns 1.000, talvez 1.500 anos antes de Cristo. Ele foi o primeiro a falar de uma batalha cósmica entre o bem e o mal, mais tarde aproveitada pelos profetas Ezequiel, Daniel e, principalmente, João. "Num mundo em que, com frequência, os bons sofrem e os maus prosperam, a promessa de um julgamento moral é um consolo profundo", diz Michael Barkun, professor de ciência política da Universidade de Syracusa, que estuda a relação entre violência e religião. Eis por que o fim do mundo aterroriza mas também nos pode consolar. Nem sempre o apocalipse vem numa embalagem religiosa. A profecia de 2012 começou com base em eventos astronómicos e calendários antigos. Só depois recebeu a adesão das seitas espíritas e cristãs, mas originalmente 2012 é, digamos, um fim do mundo pagão. Se não é um fim com prémio aos bons e a punição para os maus, então por que acreditamos em profecias que nunca se concretizam?
A explicação começou a surgir nos anos 50, quando o brilhante psicólogo americano Leon Festinger (1919-1989) resolveu testar uma hipótese revolucionária: a de que, diante de uma profecia fracassada, os fiéis não desistem da sua crença, mas, pelo contrário, se agarram ainda mais a ela. Festinger e os seus colegas infiltraram-se numa seita que se preparava para o fim do mundo e descobriram exactamente o que imaginavam. O grupo era formado por quinze pessoas e liderado por uma dona de casa do estado de Michigan, Marion Keech, que fora informada por extraterrestres de que o mundo acabaria com uma inundação no dia 21 de dezembro – reparem na data, aí de novo – de 1954. Antes da catástrofe final, Marion e os seguidores seriam resgatados pela nave-mãe e levados para um lugar seguro. Na data e hora marcadas, eles reuniram-se para esperar o resgate, mas não apareceu nave nenhuma. Passou uma hora, e nada. Duas horas, e nada. Eles estavam tensos e preocupados, alguns começando a dar sinais de descrença naquilo tudo, até que, quase cinco horas depois, Marion revela ter sido novamente contactada pelos extraterrestres com uma novidade redentora: o grupo ali reunido, com o poder da sua crença, espalhara tanta luz que Deus resolvera cancelar a destruição do mundo. Os membros reagiram com entusiasmo evidente. Haviam encontrado um meio de acreditar que a profecia, afinal, estava certa.
O caso foi contado no livro When Prophecy Fails (Quando a Profecia Falha) e tornou-se um dos fundamentos do que veio a chamar-se teoria da dissonância cognitiva. É a inclinação que temos para reduzir o profundo desconforto provocado por duas informações conflituantes – no caso, a crença de que o mundo vai acabar e a evidência incontornável de que o mundo não acabou. Há exemplos mais rotineiros, como aquele sujeito que sabe que o cigarro pode matar e, no entanto, fuma dois maços por dia. Tem-se uma "dissonância cognitiva", que precisa ser resolvida: ou o sujeito pára de fumar ou racionaliza que o cigarro, no fundo, acalma, emagrece, seja o que for e o que Deus quizer. Meio século depois, a tese de Festinger será ainda válida para explicar a crença inabalável em profecias fatalistas? "É, ainda, a melhor explicação psicológica", diz Daniel Gilbert, da Universidade Harvard, autor de um trabalho pioneiro sobre como encaramos e previmos o futuro – com uma lupa, diz ele, sempre dando aos sucessos ou fracassos uma importância muito maior do que efectivamente terão quando (e se) acontecerem.
As profecias do apocalipse são um desastre como previsão do futuro, mas excelentes como alegorias no presente. A colecção de frescos e pinturas clássicas que retractam o Juízo Final, como a obra-prima de Michelangelo na Capela Sistina, reflecte o temor do tribunal divino e o domínio da Igreja Católica de então. Depois da II Guerra, os filmes de Hollywood, grandes difusores da catástrofe final, passaram a enfocar o fim do mundo como resultado de uma guerra nuclear ou de um monstro deformado pela radioactividade. Estavam a narrar as aflições dos americanos com a bomba de Hiroshima e Nagasaki e a chegada da corrida armamentista com a União Soviética. É o momento em que o apocalipse começa a ter duas fontes – a religião e a ciência. Nos anos 60, com as profundas transformações varrendo os EUA, da Guerra do Vietname à revolução sexual, do advento do computador ao movimento dos direitos civis, dos Beatles a Woodstock, o apocalipse mudou de lugar. "O livro da revelação deixou o gueto cristão e entrou no coração da política americana e da cultura popular", escreve Jonathan Kirsch em A History of the End of the World (Uma História do Fim do Mundo), um óptimo inventário do apocalipse.

CADA ERA TEM O SEU ANTICRISTO

O terrorismo islâmico derrubando as torres de Nova York: a ideia do apocalipse é um desastre como previsão do futuro, mas excelente como alegoria do presente

Desde os anos 50, cada década tem tido pelo menos uma dúzia de filmes apocalípticos dignos de nota produzidos por Hollywood, de Godzilla a Apocalypto, de O Planeta dos Macacos a Matrix, de O Bebê de Rosemary a Presságio. Eles sempre narram algo do seu tempo, e rendem boa bilheteira. Há estudiosos que acreditam que mesmo o Livro do Apocalipse teria sido uma resposta às perseguições que os cristãos sofriam durante o Império Romano – e a besta, o Anticristo, o Satã seriam Nero, o imperador que lançou fogo a Roma. Como os apocalipses tomam a forma da sua época, o Anticristo actualiza-se também. Na II Guerra Mundial, era Adolf Hitler. Hoje, é Osama bin Laden. Isso é claro nos EUA, cuja condição de potência acaba por difundir as suas neuroses e os seus achados para o mundo inteiro. O apocalipse na cultura? Antes, eram os hippies com a sua percepção extrassensorial e as drogas alucinógenas. Depois, no ano 2000, foi o tecnoapocalipse, na forma do bug do milénio. O apocalipse na política? Antes, era o Exército Vermelho e as Brigadas Revolucionárias. Agora, é o terrorismo islâmico. Como disse Eric Hoffer (1902-1983), que passou a vida como estivador e filósofo: "Os movimentos de massas podem surgir e espalharem-se sem a crença num deus, mas nunca sem a crença num diabo".
Nenhuma das hipóteses do fim do mundo em 2012 mencionadas neste artigo faz sentido. O planeta Nibiru nem sequer existe. A civilização Azteca (México), cujo auge se deu entre 300 e 900 da era cristã, tinha três calendários: o divino, o civil e o de longa contagem, que termina em 2012. "Mas os aztecas nunca afirmaram que isso era o fim do mundo", diz David Stuart, da Universidade do Texas, considerado um dos maiores especialistas em epigrafia azteca. Uma mudança no eixo de rotação da Terra é impossível. "Nunca aconteceu e nunca acontecerá", garante David Morrison, cientista da Nasa, agência espacial americana. Uma reversão do campo magnético da Terra? Acontece de vez em quando, de 400.000 em 400.000 anos, e não causa nenhum mal à vida na Terra. Tempestade solar? Também acontecem e em nada nos afecta. Derradeiro alinhamento planetário em que a Terra ficará no centro da galáxia? Não haverá nenhum alinhamento planetário em 2012, e, quem souber ou descobrir onde fica "o centro" da nossa galáxia ganha uma viagem interplanetária oferecida pela NASA. Mas Patrick Geryl, que se prepara para o fim do mundo, está certo de que tudo vai terminar em 2012. E se não terminar? Geryl pensa, medita, olha para o alto e responde: "Não existe essa hipótese". Ele e o seu grupo vão com certeza encontrar uma boa explicação quando o dia raiar, em 22 de dezembro de 2012. Afinal, é preciso prepararem-se para um novo fim do mundo.
Até lá, as bilheteiras dos cinemas vão funcionando.
A. Dias

Fonte: The New York Times

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

"Isto está a passar todas as marcas"

Sócrates quer saber se foi escutado «legalmente»

Perante as investigações no processo "Face Oculta", o Primeiro-ministro admite que «isto está a passar todas as marcas».

José Sócrates quer saber se foi escutado legalmente no âmbito do processo «Face Oculta» e para tal aguarda os esclarecimentos do procurador-geral da República. «Se durante meses a fio fui escutado, e porque isto está a passar todas as marcas, quero saber se essas escutas foram legais e se é possível fazê-las num estado de direito democrático», afirmou o chefe do Executivo, no Centro Cultural de Belém, à entrada para uma sessão sobre os resultados do potencial tecnológico e científico.
«Espero que o senhor procurador (Geral da República, Pinto Monteiro), com o esclarecimento que prometeu, possa esclarecer-nos a todos». Recorde-se que segundo o semanário «Sol», avança esta sexta-feira, Sócrates mentiu, no Parlamento, quando negou ter conhecimento sobre o negócio da PT com a Prisa, envolvendo a TVI. Sócrates acusou o semanário «Sol» de o ter «insultado» a propósito das escutas no âmbito do processo «Face Oculta» e reiterou as declarações prestadas no Parlamento, de que desconhecia o negócio entre a PT e Prisa, sobre a TVI. «Isso não passa de um insulto desse jornal, que não dá uma notícia, mas faz um insulto. Mantenho tudo o que disse no Parlamento e não tenho nada a acrescentar», declarou o líder do Executivo.
Segundo Sócrates, nem ele, «nem o Governo, tinham qualquer conhecimento oficial, nem nenhuma informação prévia de nenhuma intenção empresarial da PT. Isso é completamente inverdadeiro. Não é verdade o que diz esse jornal e classifico isso apenas como um insulto», insistiu.
Sobre as escutas, refere saber apenas «o que vem nos jornais» e reitera que o processo o «entristece no plano pessoal por envolver um amigo», mas é «um sinal evidente de combate à corrupção que é preciso incentivar». Questionado sobre o teor das conversas telefónicas com o ex-ministro socialista Armando Vara, arguido no processo «Face Oculta», Sócrates respondeu deste modo:
«Era só o que faltava que agora me pusesse a comentar conversas que tive com pessoas amigas ao telefone e, principalmente, as versões que um jornal diz que eu tive nessas conversas. Fazem parte da reserva da minha vida privada, tive essas conversas com um amigo. Estou à espera que alguém também diga se essas gravações são verdadeiras», disse.
Sócrates procurou em seguida fazer uma distinção entre as posições assumidas na qualidade de primeiro-ministro e o teor de conversas informais que tem com amigos seus. «Uma coisa é naturalmente discutirmos, com amigos, como fiz, relativamente a notícias que são publicadas nos jornais e a conhecimentos informais; outra coisa é, como disse no Parlamento, como primeiro-ministro, o conhecimento oficial e o conhecimento prévio desse negócio (compra da TVI pela PT). Em relação a esse negócio não tenho nada a acrescentar ou a retirar», declarou.

Ainda as Portagens

Portagens não devem aumentar em 2010

As portagens voltam à "órdem do dia", como lembretes para futuros aumentos.

As portagens não devem aumentar no próximo ano, de acordo com o Ministério das Obras Públicas, que justifica com a lei, que diz que a actualização das taxas de portagens deve levar em conta o índice de preços ao consumidor.
Em Outubro, a taxa de inflação foi negativa, menos 1,5%, portanto, respeitando a legislação, os preços das portagens, cuja actualização deve ser comunicada pelas concessionárias ao Ministério das Finanças até ao próximo domingo, não devem sofrer qualquer alteração.
Segundo a tutela, em declarações à TSF, as tarifas podem até ficar mais baratas, caso haja deflação, apesar de, nessa situação, as concessionárias não serem obrigadas a baixas os preços, portanto as portagens devem manter-se.
Para o presidente do Observatório de Estradas e Cidades, Nuno Salpico, as concessionárias foram apanhadas de surpresa pela crise, mas «nunca ficarão a perder».

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Imagem da Semana

Massacre no mercado

Foram mais de 100 vítimas inocentes no Paquistão entre elas crianças e mulheres, outras 160 no Iraque e um silêncio ensurdecedor no resto do mundo.

Todo e qualquer atentado terrorista é hediondo, mas o que aconteceu na semana passada em Peshawar, no Paquistão, teve uma característica particularmente perversa. O carro-bomba, com motorista suicida, serpenteou pela área interna de um mercado ao ar livre mesmo em cima da hora em que as mães vão buscar os filhos à escola e preparam-se para comprar comida para fazer o jantar.

A explosão matou mais de 100 pessoas, na maioria mulheres e crianças. Com o mesmo método e a mesma filiação ideológica – o radicalismo islâmico, recrudescido diante da percepção de que os Estados Unidos vacilam –, outros dois carros cheios de explosivos provocaram nova carnificina no centro de Bagdad: mais de 160 pessoas ficaram estraçalhadas.

Tão assombroso e terrível como as bombas, foi o silêncio mundial perante o horror do massacre dos inocentes. Os jovens anarquistas de roupas modernas que fazem barafunda e desacatos em cada reunião do G-20 ou do FMI? Nada. As senhoras de cor-de-rosa que protestam contra todas as ações militares dos Estados Unidos? Caladíssimas. E os imãs, os chefes das mesquitas ou os fiéis comuns dos países muçulmanos, indignados com a matança de seus irmãos de fé? Nem pensar.

Os motivos obedecem a razões deturpadas. Em relação ao Iraque, é porque as vítimas são xiitas, que ascenderam ao poder com o derrube de Saddam Hussein, e qualquer manifestação de apoio a eles é vista como endosso à invasão americana. O mesmo raciocínio enviesado aplica-se, noutras condições, ao Paquistão, onde talibãs e companhia barbarizam a seu bel prazer.

O governo do Iraque pediu à ONU que abra um inquérito sobre os atentados. Será interessante ver como o hipócrita pacifismo selectivo reage.

Já apareceu o primeiro abaixo-assinado?

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Opinião do Leitor

Muito pouco...

SOS RACISMO vai à Biblioteca da Escola Secundária de Albufeira partilhar as suas experiências e descobertas. Talvez este encontro pudesse ser aproveitado por alguns colegas comentadores, já que será feito na Biblioteca à Noite, creio que a partir das 20h00. Vai fazer bem a muita gente.
Deixem os vossos rendimentos de lado e dediquem-se à altura dos homens que fazem outros melhores homens...
C. Ferreira alerta para várias deficiências no trato que este país (as pessoas do país) tem revelado com os seus cidadãos. Se bem repararem, o problema vem sempre dar aos que governam. Se no poder central temos exemplos de corrupção, certamente com consequências para muitos de nós, no poder local e municipal todos somos muito "bem entendidos"...
Entendemos que os presidentes de câmara fazem asneira grossa, pelo menos alguns, mas não fazemos nada. Até achamos algo normal, na medida em que são eles que têm o poder, e por isso mesmo, quem me dera ser como ele(s)!
Para mim o pior de tudo está nesta aprendizagem da desculpabilização daqueles em quem votamos! O exemplo de Albufeira é paradigmático. Todos "entendem bem", "muito bem demais, até", que temos tido uma pessoa que nos corrompe a todos com os seus dotes de subserviência, mas ele, a vida, é mesmo assim!
Meus caros, desculpem: "porra pra isto!" Já chateia tanta "boa educação" sobre o gajo que nos "ajuda", que nos dá música, que nos dá baile, que nos "engoda" a vida....
A comunicação em Albufeira ainda não existe porque se tornou dependente do presidente da câmara. Aliás é o seu album de fotografias mais conhecido. Albufeira é governada como uma instituição privada qualquer. O que dali sai para bem de TODOS é muito poucochinho....
A Ramos

domingo, 8 de novembro de 2009

Crónica de Domingo

Desilusão

Confesso que fiquei totalmente sensibilizado pela singularidade das três dezenas de comentários ao meu último 'post' colocado, especialmente pelas suas extraordinárias evidências de sinceridade. Passadas que são ainda só três semanas, tenho receio de estar ainda em estado de transição psicológica de tal modo que venha a dificultar a verdadeira expressão do que sinto. Provavelmente, esse efeito é devido em grande parte ao tom amistoso com que muitos desconhecidos se abriram ante mim. Hoje - por sinal Domingo, pela primeira vez desde esse dia, tenho algum tempo disponível para voltar ao Algarve Reporter e deixar uma mensagem, agora a partir do Brasil - essa a grande vantagem da net - viver-mos numa aldeia global, especialmente dirigida a alguns leitores.

Aqui, do outro lado do Atlântico tenho falado e convivido com alguns portugueses que me dizem "cobras e lagartos" de Portugal. Na verdade, quando aí estamos não se tem a percepção da real opinião dos portugueses que por um motivo ou outro foram obrigados a deixar a nossa terra, e constacto que a situação política e social no Portugal de hoje colocou a milhas desse pequeno território que sempre amaram muitos portugueses, e ao qual sempre devotaram o seu trabalho, e muitos deles a onde sempre regressaram depois de inúmeras viagens efectuadas por outros países. Depois de os ouvir, constacta-se que hoje, por vários motivos, essa não é já mais a verdadeira terra onde eles nasceram, e sentem dificuldade em regressar mesmo que o quizessem. E não me refiro ao processo natural de evolução em todos os países com progresso onde coexistem coisas boas e coisas más, mas sim no aspecto humanístico. A degradação social existente, a hipocrisia e desfassatez, compadrios e desonestidade descarada e latente da maioria dos políticos de todas as cores (os poucos que se salvam, confirmam a regra) e a falta de uma verdadeira qualidade de vida no campo do trabalho e da Saúde (especialmente no Algarve), cansaram, e fizeram com que desejassem também eles "Virar uma página" nas suas vidas, trocando o nosso País, por outro onde são agora apenas um simples emigrante, tal como aconteceu a milhares na década de sessenta quando foram "empurrados" em condições miseráveis para França e a Alemanha. À boa maneira portuguesa, dizem-me "cada país, tem os cidadãos que merece", e cada cidadão deverá ter o direito de escolher o sítio onde possa ser mais feliz.

Há vários anos que vinha reparando no descontentamento e revolta que muita gente sentia, e vivia amargamente, em particular pela falta de seriedade = honestidade dos políticos que dirigem os destinos desse pequeno rectângulo ao canto da Europa. Assisti à saída de muitos jovens para Inglaterra e outros mais velhos para África e o Brasil. A resposta era sempre a mesma: "Isto está insuportável, vivemos num país de crápulas mafiosos e vigaristas institucionalizados sob a capa de gente boa. E quem paga a factura somos sempre nós!"
Na realidade, esse não era mais aquele onde eles desejavam viver. E lembrava-me então - tal como hoje, de um episódio vivivo numa viagem que fiz a Itália, nos anos 90, e que mais tarde passei ao papel, como crónica para um jornal. Hoje volto a repescá-la para vos deixar uma pequena história que afinal se repete interminávelmente.

Numa tarde de Outono, na Piazza di San Marco. Andava pouca gente na rua; mas na espaçosa praça, as bandeiras ondulavam impelidas pela brisa marítima, diante dessa sumptuosa maravilha de cor e linhas arquitectónicas que se ergue com um luminoso encantamento contra um sol ligeiramente azulado. Por detrás da porta principal, um homem estava a deitar milho aos pombos que acorriam, em nuvens cada vez mais numerosas, de todos os lados. Um quadro alegre e festivo.
Encontrei-o na praça e estou ainda a vê-lo nitidamente enquanto escrevo. Era bastante abaixo da estatura média e um pouco curvado, passeando com vivacidade e agarrando a bengala atrás das costas. Usava um chapéu de coco, um casaco leve de Verão e umas calças escuras listadas. Não sei por quê, tomei-o por um inglês. Tanto podia ter quarenta anos como sessenta. O seu rosto estava bem barbeado, com um nariz grosso e uns olhos negros cansados; em redor da sua boca brincava constantemente um sorriso inexplicável e, de certo modo, simples. Mas, de vez em quando, olhava em volta inquieto, depois punha os olhos no chão, murmurava algumas palavras para si, sacudia a cabeça e caía de novo no mesmo sorriso. Deste modo caminhava na praça, perseverante, de um lado para o outro.
Depois desse primeiro encontro, passei a reparar nele todas que por ali passei; porque me parecia não ter outra ocupação além de passear para baixo e para cima, trinta, quarenta ou cinquenta vezes, com bom ou mau tempo que fizesse, sempre só e sempre com aquele extraordinário aspecto.
Na noite que pretendo descrever tinha havido um concerto por uma banda militar. Eu estava sentado numa das pequenas mesas do café Florian que estavam espalhadas na Piazza; e quando, após o concerto, a multidão começou a dispersar, o meu desconhecido, com o seu habitual sorriso vago, sentou-se numa cadeira livre perto de mim.
A noite seduzia, o cenário tornava-se cada vez mais sereno, em breve todas as mesas ficaram vazias. Apenas alguns vagabundos partiram, a majestosa praça ficou envolvida em paz, o céu, por cima, multiplicou-se em estrelas; uma grande meia lua pendia sobre a espetacular fachada de San Marco. Eu tinha estado a ler o programa distribuído, de costas viradas para o meu vizinho, e estava para lhe ceder o campo quando fui obrigado, pelo contrário, a virar-me na sua direcção. Apesar de eu não ter emitido nenhum som, ele começou subitamente a falar:
"Está em Veneza pela primeira vez...", perguntou ele, num potuguês impecável. Fiquei atónito. Disse-lhe que sim e entabulámos então uma longa conversa que nunca mais esquecerei. E contou-me a sua história. Empresário abastado no norte de Portugal, com fortuna de famíla, viu-se expoliadado de todos os seus bens através de processos fraudulentos que a justiça portuguesa caucionou. Uma história incrível! Incompatibilizado com a terra onde nascera, restou-lhe pegar nos poucos bens que conseguiu reter e sair do país. Perguntei-lhe por fim se estava bem, se não sentia saudades. Ele inclinou-se para trás e olhou para mim, pestanejando rapidamente com uma expressão inexplicável e serena. A pausa que se seguiu durou algum tempo. Eu não sabia como havia de continuar a conversa e quando lhe ía dizer outra coisa ele, precipitadamente, se inclinou para mim.

“Sabe, meu caro senhor, o que é a desilusão?”, perguntou, num tom baixo e apressado, agarrando a bengala com ambas as mãos. “Não é o mau êxito em pequenos assuntos insignificantes, mas a desilusão grande, geral, que engloba tudo, tudo o que faz parte da nossa vida? Não, claro, não sabe, é um jovem. Mas eu tenho sido acompanhado por ela desde a juventude; ela tornou-me solitário, infeliz e, não o nego, um pouco excêntrico.
O senhor não pode, claro, compreender de repente o que eu quero dizer. Mas devia. Por isso lhe pedi a sua atenção durante alguns minutos. Porque se isto pode ser contado, é possível fazê-lo em poucas palavras. Posso começar por dizer que descendo duma família de clérigos, numa pequena cidade. Em nossa casa reinava a absoluta limpeza e o patético otpimismo dum ambiente inteligente. Respirávamos uma atmosfera estranha, cheia de retórica de púlpito, de grandes palavras para o bem e o mal, belas e desprezíveis, que eu odiava amargamente – são elas mesmo, talvez, a causa de todos os meus sofrimentos.
Para mim a vida consistia inteiramente nessas grandes palavras; porque não conhecia mais do que as grandes emoções infinitas, metafísicas que elas despertavam em mim. Do homem, eu esperava a virtude divina ou a horrenda perversidade; da vida, ou a beleza mais arrebatadora ou o mais completo horror; e estava cheio de avidez por tudo isso e de uma saudade profunda, atormentada, por uma realidade mais ampla, por uma experiência não importa de que gênero, fosse uma ventura gloriosa e intoxicante ou uma angústia indizível.
Recordo, senhor, com uma dolorosa nitidez, o primeiro desapontamento da minha vida - o cinismo, a desonestidade e a hipocrisia das pessoas; e rogo-lhe que observe que este não tem nada a ver com o malogro de esperanças particulares, mas sim com um triste acontecimento. O de ter sido roubado e expoliado pelo meu próprio País.
Não acredito mais nessa gente, no que dizem e no que prometem, nada, – tudo é mentira e covardia. E deve ter observado, meu caro senhor, que há seres humanos tão frívolos e vorazes da admiração e na inveja do seu semelhante que pretendem ter experimentado as alturas da felicidade mas nunca o abismo da dor? Aproveito para lhe confessar sem pejo, que ainda tentei ser como esses homens e mostrei-me feliz perante esse mundo hipócrita lusitano. Mas há alguns anos que o balão dessa vaidade estava furado. Agora estou só, algo infeliz e, não posso negá-lo, um pouco excêntrico.
A minha ocupação favorita é contemplar, à noite, o céu estrelado – é a melhor maneira de afastar a vista da terra e da vida. E talvez me possa ser perdoado o facto de ainda perseverar nas minhas remotas lembranças, a esperança. Por que sonho eu com uma vida mais livre, onde a actualidade das minhas loucas antecipações se revela sem nenhum torturante resíduo de desilusão? Com uma vida onde não há horizontes?
Assim, eu sonho e espero que a morte venha. Ah, já a conheço bem, a morte, esse desapontamento derradeiro! No meu último momento, direi para os meus botões: ‘Então é esta a tal grande experiência – bem, e o que tem isso? Que é isso, no fim de contas?’ Mas a Piazza começa a arrefecer, senhor – isso ainda eu posso sentir – Àh,... Tenho a honra de lhe desejar uma muito boa noite.” E levantou-se, desaparecendo entre as sombras das colunatas do Palácio dos Dodges.
Carlos Ferreira